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The Missing: 8.0

  • Gi Saggiomo
  • 12 de jul. de 2018
  • 5 min de leitura

A manhã seguinte estava bem tranquila... Bem, tão tranquila quanto o dia seguinte ao do assassinato de 15 figurões da cidade poderia ser. As pessoas encaravam a delegacia com medo do lado de fora, outros davam um sorriso sabichão, como se achassem que a polícia havia deixado que tal assassinato acontecesse. A opinião popular estava claramente dividida e Prado tinha medo que aquilo fosse piorar ainda mais a situação dele com a mídia, ou mesmo com o capitão. Ele não desistiria de seu cargo como os outros haviam feito antes dele. Mas esperava ter tempo de ajeitar tudo antes que fosse expulso da força policial. Os corpos ainda estavam passando pela autópsia, afinal, os robôs haviam encontrado um veneno não registrado. Ele pensou em sugerir que houvesse algo a ver com a tal cobra Taipan, mas temeu que ele não soubesse como explicar e resolveu deixar que os robôs descobrissem sozinhos. Eles eventualmente descobririam, certo? Já era meio da tarde quando ele ouviu o barulho de salto-altos atravessando a delegacia, para descontento dele, ela havia mesmo voltado. - Boa tarde, delegado Prado. - Boa tarde, doutora. - Devo concluir que está pronto para que voltemos ao inventário? - Por que a pressa, doutora? - Bom, eu preciso encerrar esse caso o mais rápido possível. Eu não recebo por hora, delegado. A resposta dela era bem pertinente, ele tinha de dizer, mas a verdade é que ele não havia perguntado por estar interessado, mas sim porque queria mais tempo. Ele tinha muita coisa na cabeça para se preocupar em catalogar bonecos. - Chamarei o R09 para que ele te auxilie com o inventário. - Você não pretende ajudar? - Ainda não descobriram o que causou a morte, então terei que voltar até o casarão. - Aquele lugar não te deixa desconfortável? - Claro. Quem não ficaria? A advogada pareceu pensar por alguns segundos, depois, concordou com a cabeça. Sem dizer mais, ela puxou da bolsa um bloquinho e uma caneta e se sentou na cadeira diante da mesa dele. - É só? - ele perguntou, estranhando o comportamento subitamente dócil dela. - Sim. Não quero lhe atrapalhar mais do que o necessário. Ele se levantou de sua mesa e saiu, ordenando que alguns dos robôs levassem até ela as caixas, deixando a delegacia em seguida. Havia algo em advogados que o deixava constantemente desconfortável. O jeito deles de sempre estarem cantando vantagem ou mesmo o sorriso nos lábios que sugeria que ele era um imbecil. Mas algo naquele comportamento receptivo dela o deixava ainda mais desconfortável. Por que ela havia aceitado a ausência dele? Por que de repente ela resolvera fazer o trabalho dele sozinha? Será que ela desejava tanto assim se livrar do caso? Ainda mais do que ele? Mas se detestava tanto assim estar envolvida no caso, por que não o havia abandonado? Ou será que ela teria medo da garota? Se tinha, será que ela já a conhecia com antecedência? Muitas perguntas. Muitas perguntas mesmo, mas nenhuma que ele poderia responder. Ele voltou até o casarão sozinho e voltou à observar a sala de jantar, aquela era sem dúvida o cômodo que ele havia observado no vídeo, mas algo ainda parecia errado. Ele não entendia o vídeo. Por que alguém mandaria um vidro daquele que mais parecia uma confissão? E afinal, por que ele não havia ainda enviado o vídeo ao capitão? Se alguém descobrisse que ele estava escondendo aquele vídeo ele seria preso por obstrução da justiça, mas ainda assim aquele vídeo não lhe parecia fazer sentido. Havia algo de errado com ele. Prado caminhou por trás das cortinas, tocou a mesa e tentou movê-la um pouco, abriu os armários no canto da sala... Mas estava tudo em ordem, limpo e cuidadosamente organizado. Demais para imaginar que aqueles homens do vídeo teriam se preocupado em organizar sozinhos. Ele precisava dos criados. Subiu até o andar superior e foi abrindo as portas, uma a uma, até encontrar um pequeno escritório, ele cheirava à guardado e não parecia ser muito utilizado, mas Prado insistiu em entrar no mesmo de qualquer forma. Precisava procurar documentos que lhe indicassem quem seriam os empregados misteriosos. Depois de procurar muito até encontrar alguns documentos ele voltou à delegacia, apenas para encontrar as luzes de sua sala ainda acesas. - Ela ainda não foi embora? - ele perguntou à um dos robôs próximos da entrada. - Não, senhor delegado. Mas ela está fazendo um bom progresso com a lista, felizmente. - Um bom progresso, como assim? - Aparentemente existia um site onde colecionadores podiam montar seu perfil digital e anotar todos os seus itens. É bem simples de seguir a lista vendo foto deles. Prado soltou um suspiro cansado. Era bem verdade que se era mesmo como o robô havia falado, a tal lista tornaria o trabalho de categorizar todos muito mais fácil, mas ele se questionava se isso não era algo que ele deveria fazer, ou mesmo saber. Quando entrou de volta em sua sala a advogada havia esvaziado as caixas e começava a separar os bonecos em pilhas, numa lógica que ele não entendia. - O que está fazendo? Agora voltamos à estaca zero! - Sim, mas separando-os nas categorias do site vai ser muito mais rápido. Por que não utilizou ele desde o começo? Prado soltou um suspiro desconfortável. - Não se preocupe, não é algo que você é obrigado à saber, mas talvez se houvesse jogado na rede teria descoberto. - ela sorriu, não do jeito sabichão de costume, dessa vez parecia mesmo ser só uma dica. - Bom, eu agradeço a dica, doutora, mas pessoalmente, eu espero nunca mais ter um caso desses. Ela concordou com a cabeça, embora parecesse estar abafando um riso. - Acha o caso engraçado, doutora? - Para te ser sincera, eu acho. Você não acha? - Prado ficou em silêncio. - Uma das famílias mais poderosas da cidade foi extinta por uma universitária saída-se-lá-de-onde... Eu acho hilário, detetive. É no mínimo inusitado. - Bem, inusitado ou não, isso está causando uma tremenda dor de cabeça para todos aqui. E eu não acho que devemos rir dos mortos. - Oh, lhe falta humor, delegado. Mas ela deixou de provocações por um instante, fechando seu caderno. - Eu sinto que minha presença não é muito do seu agrado. Mas gostaria que soubesse que eu estou disposta a tornar todo esse processo o mais rápido possível. Eu imagino que você tenha muito o que fazer ainda e eu pessoalmente gostaria muito de deixar tudo isso para trás. - Você a conhecia? - ele perguntou enquanto a mulher guardava os pertences de volta numa bolsa. - Sim. Eu e muita gente. - Mas a conhecia bem? - Sim, acho que de todos, eu era a que a conhecia melhor. - Se importa de falar mais? - Eu gostaria de poder ajudar, delegado, mas eu prefiro não ter meu nome vinculado à esse caso ainda mais. - ela pegou o blazer e apoiou-o em seu braço direito. - Você é um bom homem, delegado Prado, realmente acredito que seja. Mas você precisa descobrir de que lado está. - A polícia não escolhe lados. - Não, é claro que não. - ela respondeu com um sorriso sabichão enquanto passava pela porta. - As leis também não. Quando ela foi embora Prado ficou se perguntando o que ela queria dizer. A hipótese que ele havia imaginado o deixava deveras desconfortável, mas a verdade é que ele talvez concordasse. A polícia havia falhado com aquela garota. Aquela e quantas mais? O pensamento começou a assombrá-lo naquele mesmo dia e ele gostaria de dizer que havia desaparecido de sua cabeça nos dias seguintes, mas era cada vez mais alto.

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