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Andarilhos do Alvorecer. 7.

  • Foto do escritor: Giovanna Saggiomo
    Giovanna Saggiomo
  • 6 de out. de 2017
  • 4 min de leitura

Já era noite quando todos se retiraram para seus quartos, já devidamente instalados e acomodados, me deixando por fim sozinha para falar com Benji. Porém, andar pelo templo era bem mais difícil do que aparentava e demorou um tempo para notar que eu provavelmente havia virado algum corredor errado.

A maioria das salas ali eram vazias. Uma delas havia se tornado uma capela improvisada e uma outra o que parecia ser uma enfermaria.

Foi quando um cheiro de incenso chamou minha atenção e eu, sem ter mais para onde ir, resolvi ir ver de que se tratava. Era uma sala grande cheia de velas e incensos, no centro dela Benji estava sentado sem camisa novamente na posição de lótus. Suor escorria por suas costas o que eu estranhei quando estava no corredor, mas ao entrar, compreendi, o ar da sala estava completamente condensado, como se estivéssemos em uma sauna.

- Não achei que fosse do tipo que gosta de ficar perseguindo as pessoas.

Eu apenas sorri para ele e ele me devolveu um sorriso malandro, sinal de que estava tentando se vingar pela minha brincadeira debaixo do carvalho.

- Não te tomava como o tipo vingativo.

- Só com quem leva isso bem. - ele me sorriu. - Imagino que estava me procurando para que respondesse suas perguntas.

- Bom, na verdade eu me perdi... Mas isso está bom também. - menti.

Ele sorriu um segundo, como se soubesse meu segredo, mas fez um sinal com a mão, para que eu me sentasse diante dele.

Me sentei, cruzando as pernas imitando as dele, em seguida, voltei à encara-lo.

- Por que está tão abafado aqui?

- Pelo mesmo motivo que aquele espadachim foi empurrado para trás.

- Pode fazer o ar dar uma circulada? Está realmente quente. - para a minha surpresa, ele apenas movimentou os dedos em círculos no ar e o ar voltou á circular por toda a sala. - Isso é bem legal.

- Bem, isso é algo bem normal aqui.

- Está dizendo que isso aqui é tipo... O templo do ar daquele desenho animado?

Ele riu, mais alto do que o normal, mas tentou se recompor enquanto puxava a parte de cima de suas vestes para mais perto de nós.

- Não exatamente. Somos um grupo um tanto quanto diferente aqui, a maioria de nós não tinha aptidão para a espada ou o arco, mas nem por isso havíamos desistido de nossas vidas e nos entregamos para os mastigadores. A maioria das pessoas aqui tem fé.

- Fé?

- Fé de que havia uma solução. Fé de que seriam capazes de sobreviver. Fé de que tirariam de algum lugar a força para proteger aqueles que amavam. Fé, não religiosa, bem, alguns sim, mas eu diria que são uma minoria.

- Está me dizendo que ter fé deu super-poderes para essas pessoas?

- Estou dizendo que ter fé suficiente, se dedicar o suficiente, crer o suficiente... É capaz de fazer qualquer coisa, inclusive dar à essas pessoas a força para sobreviver, mesmo nas mais improváveis das situações.

- No que você acredita, Benji? - não sabia se ele responderia ou não, mas a curiosidade estava me matando.

- Eu acredito que vamos sobreviver.

A resposta dele foi bastante superficial, era verdade, mas eu deixei passar. Alguma resposta era melhor que resposta nenhuma.

Ainda assim, tinha algo que não encaixava na história.

Você deve estar se perguntando porque fui atrás do seu grupo.

Na mosca.

- Sim.

- Havíamos encontrado um dos seus ferido um tempo atrás. Ele havia comentado que a mãe e o filho estavam na Fornalha e que ele temia que se morresse, eles colocariam sua família para fora.

Eu fiquei em silêncio, boquiaberta.

- Infelizmente, não conseguimos salvá-lo, mas suas últimas palavras foram que ele rezava para que a Conselheira Mia mantivesse sua família segura.

- Oh... - eu baixei o rosto.

- Sabe, isso não é incomum. Acharmos pessoas à beira da morte se apegando à promessas vazias. - ele falava de forma calma outra vez. - Mas essa vez foi diferente, a promessa não era vazia. Quando estávamos buscando por informações da Fornalha para avisar da morte dele, descobrimos da expulsão de vocês e da conselheira que havia largado tudo para ir com eles. Nesse momento sabíamos que era você. A pessoa que estávamos procurando.

Levantei a sobrancelha, crente de que havia escutado ele errado, mas o mesmo se calou, em sinal de que havia dito tudo o que tinha a dizer.

- Para o que acha que estava me procurando?

- Você é decidida, forte, honrada, corajosa e...

- Benji, escuta, eu não sou nada disso.

- Tolice. Eu vejo como aquelas pessoas olham para você, Mia. Acha mesmo que olhariam da mesma forma se não fosse tudo isso?

- Acho que olhariam se quisessem sobreviver e eu fosse aquilo que acreditam ser sua melhor alternativa.

- Você pensa mesmo ser só isso?

- Eu não sou digna de muito mais do que isso. Estaria se enganando se pensasse o contrário.

E eu comecei a me levantar. Estava quase me virando para ir embora, quando a mão dele segurou meu punho de forma suave.

- Me desculpe, mas estou realmente cansada, Benji. A viagem exigiu mais do que eu esperava.

Ele soltou a minha mão, mas em seus olhos, estava claro que ele não havia comprado a história.

Ele me deixou ir e eu consegui voltar ao meu quarto depois de me perder mais algumas vezes. Eu revirei na cama muitas vezes, de forma que não saberia dizer se dormi de fato ou se foram apenas terrores noturnos.

Eu sabia que aquele lugar era bom e que poderia vir à ser um lar para aquelas pessoas que eu vinha defendendo à tanto tempo...

Talvez por isso não sentisse que aquele era meu lar. E ainda pior, tudo aquilo trazia uma sensação tranquila que trazia o sabor de bile ao fundo de minha garganta.

Aquele não era o meu lar.

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