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Andarilhos do Alvorecer. 1.

  • Gi Saggiomo
  • 15 de jul. de 2017
  • 3 min de leitura

Já faz um tempo que a civilização como conhecíamos se extinguiu, nossos carros tão lustrosos, nossos celulares de tela grande. Hoje em dia, nada que não sirva como arma é útil.

Eu nem me lembro mais quem foi o primeiro a trazer a tona a grande ideia. Mas sei que quando as notícias ganharam os jornais, já estávamos quase que numa corrida global de grandes potências para ver quem ganharia o grande título.

Quem ganharia o título de "curador do grande mal".

Havia sido um ano difícil. O câncer havia levado tantos dos nossos queridos naqueles poucos meses do começo do ano que nada parecia capaz de aplacar o desânimo que se abatera sobre toda a população.

Nem mesmo os programas de tv, as novelas ou mesmo os youtubers. Pouco a pouco tudo foi se calando ou se tornando cinza.

As pessoas com cabelo colorido na rua foram diminuindo, as roupas coloridas foram diminuindo e quando dei por mim, me vi um dia numa calçada cinza, cercada de pessoas vestidas em negro, prédios de vidro refletindo tudo monocromaticamente num velório silencioso.

Não havia medo, mas também não havia esperança e de certa forma, acho que o segundo era pior que o primeiro.

Foi quando tudo parecia que ia melhorar, que desandou. O remédio não só trouxe a fome dos pacientes de volta, trouxe uma fome insaciável. Não só apaziguou suas dores, acabou com elas. Não só lhes deu forças para continuarem seu tratamento... Lhes deu uma força quase sobrenatural.

Um paciente enfurecido pela fome atacou uma das enfermeiras, mordeu e arrancou a bochecha da garota fora. O segurança sem saber o que fazer atirou contra o ombro dele, achando que aquilo o faria recuar, mas ao contrário, a dor pareceu apenas deixá-lo mais enlouquecido. E ele atacou o guarda também.

...

Isso já faz mais de ano e a situação com os "mastigadores", como chamamos aqui, só piorou.

Eles se espalharam rapidamente pelos grandes centros, passando o que quer que fosse no componente do remédio pela própria saliva para aqueles que mordiam.

Os poucos que conseguiram fugir buscaram abrigos em comunidades isoladas, mas a maioria sabia que se apenas esperassem, seu destino não seria outro que não o das pessoas pegas de surpresa nas capitais.

Os primeiros ataques, feitos por aqueles que havias se alocado em acampamentos do exército haviam resultado em desastre.

O barulho parecia deixá-los ainda mais violentos e em pouco tempo todos os sobreviventes haviam sido encurralados e exterminados.

Os demais grupos, cientes disso, haviam decidido voltar-se à outros tipos de arma. A maioria se voltara à armas brancas.

Facas, bastões, qualquer coisa fácil de encontrar. Os mais dedicados havia montados escolas nas montanhas para dedicar-se às velhas artes de espadaria ou mesmo lança.

Haviam também aqueles que preferiam um combate mais distante e que manteriam a reta-guarda dos demais, eles haviam voltado a fabricar flechas em larga escala.

Pouco a pouco, agrupamentos começaram a aparecer, um aqui, outro ali. Um dos mais conhecidos ali no sudeste se auto-denominava "Fornalha".

Haviam se instalado numa antiga cidadezinha mineradora, fornecendo muito ferro e abrigo. Seus gestores eram um conselho de 5 dos mais antigos membros.

John, o mestre de armas e responsável pela linha de frente. Eaton, o líder dos arqueiros. Brendon, o responsável por toda a defesa do perímetro e unidades defensivas. Don, o responsável pelo alimento. E eu.

Muitos diriam que eu não tinha um porque de estar no conselho e talvez estivessem certos. Mas meu papel ali era manter os ânimos de todos baixos e mediar todas as discussões.

Eu era a pacificadora, pois tinha algo que aquele mundo talvez não tinha mais tempo de apreciar. Jeito com as palavras.

Minha habilidade com a espada era razoável. Com o arco era bem aceitável. Era uma boa estrategista. E vez ou outra havia mostrado a Don o quanto meu jeito com as palavras era útil na hora de distribuir a comida. Mas eu estava certa que uma boa parte do motivo de eu estar ali era para tentar tornar o trabalho deles o mais fácil possível, algo que parecia estar indo bem, uma vez que nossa comunidade parecia estar indo bem apesar de todos os empecilhos.

Ao menos, até aquela ultima reunião.

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