top of page

O Pub

  • Foto do escritor: Giovanna Saggiomo
    Giovanna Saggiomo
  • 8 de fev. de 2017
  • 8 min de leitura

Quando recebi notícia do convite que esperava pela minha confirmação, não fiquei preocupada... Ao menos, não logo de cara.

Não seria minha primeira vez em um pub, mas embora eu não me lembrasse muito do último (não que eu houvesse bebido horrivelmente, mas minha memória é péssima e isso aconteceu faz mais de sete anos), estava relativamente confiante de que uma passada rápida na sessão do meu guarda-roupa de "peças sutilmente mais finas" e daria tudo certo.

Claro, não foi bem isso que senti quando cheguei na frente do pub e vi a fila diante dele.

Fila não era algo que eu estava acostumada a ver nos locais que frequentava, a menos que fossem restaurantes.

Eu não era de ir nos lugares mais descolados ou populares e admito que o pensamento de voltar correndo para casa pois eu provavelmente não seria refinada o suficiente para aquele lugar passou pela minha cabeça algumas vezes...

Quando entrei, notei duas coisas logo de cara. Uma, eu era um pouco mais nova que a grande maioria das pessoas lá dentro e aquilo talvez me permitisse sair dali ilesa apesar da minha falta de decoro... Duas, eu deveria ter olhado a sessão de roupas que eu geralmente usava em casamentos do meu guarda-roupa antes de ir para lá.

As pessoas ali dentro estavam ridiculamente chiques. Mas não ficava ruim nelas, não ficava exagerado, como eu imaginava que ficaria em mim, ao menos.

Elas usavam vestidos e saias, algumas até mesmo calças, mas eu não conseguia deixar de me sentir um patinho feio andando perdida pelo meio dos cisnes. E para melhorar a vida desse patinho feio aqui, os cisnes que ela conhecia não haviam chegado ou parecia que chegariam logo.

Mas eu não vou discursar sobre o quanto os cisnes nunca apareceram ou sobre como um outro grupo de cisnes incrível praticamente me adotou.

Eu vim aqui para discursar sobre o que aconteceu depois.

Eles haviam me contado que haveria uma banda de rock lá naquela noite e eu estava bastante empolgada. A ideia de ver uma banda tocando tão de pertinho me deixara muito excitada. Eu queria ver como era. Queria sentir o som batendo contra minha pele, aprender como era a comunicação entre eles, como eram os tempos de respiração.

A ideia de aprimorar a minha voz vinha me seduzindo a tempo demais para que eu deixasse de aprender com aquela oportunidade. E mais do que isso, aprender sobre o pub e observar as pessoas ali me permitia também pensar em como aprimorar outras habilidades.

Foi quando um homem... Garoto? Rapaz? É, um rapaz que parecia ter próximo da minha idade subiu no palco. Eu reconheci o instrumento que ele carregava como um baixo e em silêncio, ele começou a arrumar suas coisas. Apesar do silêncio, ele era por si só uma pessoa bem chamativa, alto e de costas largas. Me lembro de ter notado o quão grande ele era e me assustar um pouco e não parecesse mais velho.

Depois dele, pouco a pouco os demais foram chegando e para mais surpresas minhas, nenhum deles parecia ser muito mais velho.

Não que eu fosse boa para avaliar idades, eu sou péssima. Péssima mesmo. Mas eles tinham expressões jovens e sorrisos divertidos. Então, ao menos para mim, pareciam jovens.

O baixista era realmente o mais alto deles, mas o guitarrista era igualmente largo, o vocalista tinha os braços bem trabalhados e no final o único que tinha uma aparência mais "normal", ou ao menos, que não me fez questionar se ele ficava tocando ou na academia era o baterista.

Aqueles meninos me surpreendiam cada instante mais e eles nem haviam começado a tocar ainda, no final, estava sendo uma experiência bem divertida, eu sabia que poderia usar tudo o que estava aprendendo mais para frente quando fosse escrever algo mais elegante ou boêmio. Mas meu pensamento foi completamente desligado, e não digo, lentamente carregado e roubado, oh não, ele foi violentamente desligado quando o vocalista começou a cantar.

Eu estava... Hipnotizada? Bestificada? Paralisada? Enfeitiçada?

Talvez tudo isso junto?

A voz dele era forte e antes que eu pudesse me dar conta, notei que estávamos o pub todo cantando junto enquanto alguns dançavam na pista abaixo de mim. Eu não notei quando um sorriso surgiu nos meus lábios, mas havia já me conformado que meus olhos não o deixariam tão já. Eu podia ver ele respirando, sua jugular marcando a pele quando ele estendia uma nota o máximo que eu achava que era o quanto ele podia.

Talvez eu estivesse o encarando demais, ou talvez fosse apenas um costume dele, de olhar para todos os lados de onde quer que ele estivesse cantando, para que todo o público se sentisse fazendo parte do show... Mas eu senti meu coração pular uma batida quando ele olhou para mim. Eu sorri para ele e continuei cantando e por um instante, ele pareceu fixar os olhos claros nos meus.

E aquilo se repetiu várias vezes ao longo da noite, ele olhava para mim e eu cantava, gostando de flertar a ideia de que de alguma forma ele podia reconhecer a minha voz no meio de todas as outras. O que era mentira é claro, eu sabia, mas eu estava deliciada naquela brincadeira.

Ele parecia se divertir com a minha ousadia de encara-lo nos olhos, eu me divertia observando-o cantar, aprendendo com sua postura conforme ele cantava outros estilos musicais e vez ou outra, quando ele me pegava o observando, eu sorria para ele enquanto cantava, podia jurar que ele chegara a me sorrir de volta também.

O baterista tocava jogando as baquetas no ar enquanto metralhava os tambores e eu ri baixinho enquanto observava as mil caretas que ele fazia. Foi quando notei que o baixista me observava enquanto parecia sussurrar algo com o vocalista. Eu corei um pouco, levantando uma sobremesa, mas o vocalista se voltou para mim sorrindo e depois voltou a cantar, com uma naturalidade que me fez rir novamente.

Ao longo da noite, aquela cena se repetira algumas vezes, eu observava seu corpo se expressando enquanto ele cantava, sua jugular saltada marcando a pele, os leves movimentos de punho, afastando e aproximando o microfone para ajudar nas alterações sutis de voz que ou ele tinha dificuldade em fazer, ou talvez o microfone não fosse perceber se ele fizesse apenas na garganta, afinal, estávamos com um sério problema de microfonia e o som se propagava muito mal ali dentro e ele, em resposta, olhava para mim quando olhava na minha direção, para dentro dos meus olhos.

Algumas vezes, ele quase parecia me desafiar enquanto cantava, e eu o desafiava de volta, alongando as notas com ele e aquilo era divertido, tão divertido quanto poderia ser.

Talvez ele nem estivesse me vendo, talvez estivesse olhando alguma garota mais alta, magra, loira ou bem-vestida atrás de mim, mas eu não me importava... Em minha mente eu tinha achado o jogo mais divertido do mundo para jogar, mesmo que fosse com um segundo player imaginário.

Quando ele anunciou que seria a última música, eu senti meu estômago cair. Meu jogo teria de acabar e eu ainda não estava pronta para ir para casa... Mas que horas eram? Quatro da manhã? Apenas quatro? Mas quando foi que quatro virou "apenas"? Ou como diria minha avó, quando foi que quatro virou hora de moçinha estar na rua?

Não que eu me importasse muito, é claro. Embora soubesse que ao menos do lado da minha avó o comentário vinha mais por preocupação do que por conservadorismos... Eu não queria mesmo ir para casa. Não queria que ele deixasse meus olhos, eu estava aprendendo muito, além de me divertir... Ou será que já havia deixado de assimilar fazia tempos, mais ou menos quando notara que ele era lindo?

Lindo? Eu disse lindo? Ah não, não, eu com certeza quis dizer... Ahn... Bonito. É. Só bonito.

Talvez se ele fosse só bonito eu conseguisse de fato resistir e me focar em algo, até porque ele era tão incrível que seria um desperdício se não estivesse.

Eles se despediram e eu assoviei e uivei em elogio, notando o sorriso dele e dos demais conforme se despediam. E por mais que eu não o quisesse perder de vista, me permiti perder. Eu não tinha a coragem de segui-lo e mesmo que tivesse, quem era eu, patinha feia, no meio de todos aqueles cisnes?!?

Era bem verdade que muitos deles tinham bicos tortos, penas mal-cuidadas, grasnados desengonçados e que perto das minhas penugens macias e coloridas e olhos grandes e brilhantes, não era o tipo de coisa que me saltava os olhos... Mas seria tolice achar que eu serie sequer visível sem todas aquelas empenedaiadas todas. Acho que a maioria gostava disso e eu não conhecia ninguém ali o suficiente saber que tipo de ave os apetecia...

Eu terminei minha bebida enquanto discutíamos como ir embora... Eu tentava controlar meus olhos que vez ou outra levantavam apenas para buscar por movimentos dele perto do balco, mas ele não estava em nenhum local que eu pudesse ver. E então, quando foi decidido, partimos.

Uma parte de mim queria poder se despedir, nem que fosse apenas para dizer o quanto havia sido bom e divertido, mas não era como se eu sentisse que tivesse esse direito de fato, afinal, quem era eu? Eu era apenas uma das várias garotas de quem ele havia arrancado sorrisos, suspiros e olhares naquela noite. E analisando pelo padrão de beleza convencional, eu nem era a mais bonita delas... Entrei no carro e ajeitei o cabelo atrás da orelha, fechando os olhos.

Podia ouvir o silêncio da noite. O barulho dos outros carros se distanciando enquanto o nosso ligava, o suave chacoalhar quase que ninando que minha consciência pesada por não ter insistido mais. Eu tentei me convencer de que aquilo era para o melhor e permaneci em silêncio por alguns segundos mais, conforme nosso carro começava a se mover.

Foi quando ele parou abruptamente que eu, ainda sem entender, procurei algo ao redor do carro que explicasse tal atitude... Quando eu achei... Apertei minhas pernas onde minhas mãos repousavam com tanta força, que acho que provavelmente teria hematomas na manhã seguinte.

Um par de mãos estavam espalmadas contra o meu vidro, por entre elas, eu podia ver um par de olhos claros brilhando de forma sagaz e divertida, conforme ele sorria.

Eu suava frio, mas as reclamações e suaves empurrões que vieram de dentro do carro ajudaram a me colocar de pé do lado de fora, frente à frente com ele. Ele tinha uma expressão zombeira, como se me desafiasse novamente à nossa brincadeira, afinal, eu passara a noite toda encarando-o dentro dos olhos quando ele não podia fazer nada - algo que pensando agora, fora um tanto quanto covarde e cretino de minha parte - e ele parecia disposto a retribuir o favor agora, apoiando as duas mãos contra o carro onde antes eu estivera sentada, me prendendo por entre seus braços fortes, me olhando tão de perto que eu podia sentir o calor que emanava de seu corpo.

Eu admito, ele havia vencido. E ele parecia saber disso pelo meu sorriso manso e pelo dele que se tornou mais largo antes de ele abaixar um pouco o rosto na minha direção.

Os lábios que eu havia observado durante a noite toda enquanto cantavam não estavam mais no meu campo de visão pois agora estavam tocando os meus e eu podia sentir conforme todo o meu corpo era tomado pelo calor dele conforme seus braços me envolviam.

...

Quando acordei na manhã seguinte, podia sentir meu corpo mais pesado que o comum e eu estava certa de que não havia bebido o suficiente para isso. Minha consciência ainda estava transitando entre o que era real e os sonhos, mas eu podia jurar ter ouvido um barulho vindo de algum lugar próximo...

E então, eu abri os olhos.

...

Posts recentes

Ver tudo
O Passarinho

- Para qual andar quer ir, querida? Como num passe de mágica, ou talvez, como se eu fosse engolida por um buraco negro, quando olhei...

 
 
 
A Lenda dos Teasels - 2.

​ O príncipe se despediu e pediu algo à Meriak, se afastando do pelourinho e indo na direção de Bridget. Após conversar um pouco com ela,...

 
 
 
Destaque
Categorias

© 2023 por Gi Saggiomo. Orgulhosamente criado com Wix.com

  • Facebook B&W
  • Twitter B&W
  • Google+ B&W
bottom of page